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ISAO NISHI Bigode bem aparado e
discurso
fácil. Nem mesmo um insolente derrame conseguiu afetar a
memória e a eficácia
da oratória de Isao Nishi, um dos maiores expoentes da
coletividade. Isao
continua dando show, até palavrões se encaixam, e bem
ajustados, em suas
construções verbais. Afirma que parou, que está
proibido de advogar, de
assessorar político, de fazer parte do governo. Mas continua
sendo um exímio
contestador. Onde e como você
passou a primeira fase da vida?
Isao: Nasci em Bastos,
interior
de São Paulo, e vivi meus primeiros anos cercado por
algodão. Meu pai, Shizuiti
Nishi, comprava algodão para beneficiar. Tinha umas 50
máquinas de
beneficiamento na região. Comprava toda a produção
da Alta Paulista, mais de um
milhão de arrobas. Era um homem de muito prestígio. Meus
pais foram também
fundadores de Bastos. Então desde
menino você ajudava
o pai nos negócios. Isao: Não, eu
só estudava.
Conclui o primário com a melhor nota da escola. Foi quando pedi
a meu pai para
estudar em São Paulo. Sou muito grato à antevisão
dele. Saí de Bastos sozinho,
com apenas dez anos. Pequei o trem da Sorocabana e vim para cá..
em Bastos não
havia mais ginásio. A escola São José,
administrada pela colônia, tinha sido
fechada por causa da Guerra. E como você se
virou na Capital?
Isao: Hospedei-me num
pensionato, em Pinheiros, atual sede do clube Piratininga. Ali
funcionava uma
escolinha do sr. Matao Tanaka, ex-diretor do grupo escolar de
Bastos. Cursei o
ginásio no Oswaldo Cruz, melhor colégio da época.
E nunca paguei mensalidade.
Ganhava bolsa por ser o melhor aluno de todo o colégio. Mas era
danado também. Por que você diz
isso?
Isao: Eu era contra
aquela
bobagem de ação cívica. Faziam até palestra
sobre
guerra. Uns tontos. E o
sobrinho do chanceler Oswaldo Aranha vivia me cutucando: “Você
é a favor ou
contra o Brasil?”. Um dia, enfiei-lhe a mão. O professor de
história, major do
exército, um reacionário, quis me expulsar. Mas os outros
não permitiram.
Então, suspenderam-me por um dia. Minha classe, em
solidariedade, entrou em
greve. Escrevi para o ministro da educação e, algum tempo
depois, um inspetor
federal começou a interpelar a diretoria. Era o melhor aluno, mas
longe de
ser comportado. Isao: Sempre fui
contestador, e
sempre me expressei muito bem. Lembro-me do professor de
português, analfabeto.
Era a primeira aula, e eu chegava atrasado de propósito. A lousa
já estava
cheia de absurdos. “Pode apagar porque está tudo errado”, eu
exigia aos 14
anos. Quando terminei o ginásio, não me deixaram
continuar no Oswaldo Cruz.
Além de encrenqueiro não dava lucro para a escola.
Chamei-os de mercantilistas
e me matriculei no colégio Anglo-Latino. No Anglo-Latino... Isao: Fui eleito
presidente do
centro cívico. Mas, para a gestão posterior, tive de
fazer a eleição no cine
Capitólio. Os diretores proibiram-me de ocupar o colégio.
Nessa época fundei a
União dos Centros Estudantis do Estado de São Paulo
(UCESP), precursora da UEE
e da UNE. O Dops tinha a minha ficha completa. É que, sem saber,
eu convocava alunos ligados ao comunismo
para me auxiliarem.
Cheguei até a livrar alguns cupinchas da cadeia coma ajuda do
governador Ademar
de Barros. Ele me respeitava e me admirava. Nas eleições,
eu havia vencido na
região da Alta Paulista. Era mesmo precoce. Bom, e depois do
colégio,o que você resolveu
cursar?
Isao: Em 1947, entrei
em Física
e Matemática na USP. Apesar de professores e colegas
extraordinários, como
Mário Schenberg e Roberto Omar Catula, não consegui
seguir em frente. Também,
só fazia política. Não tinha tempo para estudar. E
o curso era difícil. Desisti
para ingressar em Direito, no Largo São Francisco. De lá
para cá, assessorei
grandes empresas, principalmente as de origem japonesa. Ganhamos uma
causa de
R$ 40 milhões para a Prológica contra a Microsoft, do
Bill Gates. Seu nome também
está muito
ligado ao beisebol. Isao: E como. Presidi a
Federação Paulista de Beisebol por 30 anos consecutivos.
O beisebol evoluiu
muito comigo. O estádio municipal de beisebol, no Bom Retiro,
tem o nome de
minha mãe: Mie Nishi. Fui também presidente, em
várias gestões, da Confederação
Sul Americana de Beisebol Amador e vice-presidente da
Federação Internacional
de Beisebol Amador. Num panamericano disputado no Chile, fiz o mais
belo
discurso de minha vida, para um estádio lotado. O Chile vivia um
período de
eleições. Muitos candidatos vieram me convidar depois
para participar de suas
campanhas. Sempre fui o maior orador da coletividade. Por falar em
coletividade, o que você chegou a
fazer pelos nipo-brasileiros?
Isao: A começar
pelo
cinqüentenário da imigração, em 1958. sempre
achei que a festa deveria ser
oferecida pelos brasileiros. O governador Jânio Quadros estava
com vergonha de
receber o príncipe Mikasa com aqueles festejos mixurucas de
sempre. Deu-me todo
o seu aval para revolucionar a comemoração. Eu e o
Gervásio, presidente da CAC,
conseguimos o patrocínio de grandes empresas. Foi
inesquecível. Preparei um
desfile com 200 carros alegóricos, tendo como abre-alas o navio
Kasato Maru.
Realizamos uma corrida automobilística em Interlagos, com os
melhores pilotos
do mundo. Mesmo assim quiseram me sabotar. O desfile deveria
começar às 12h30,
com o príncipe. Mais de 400 mil pessoas o aguardavam no
Anhangabaú.
Disseram-lhe que a festa só começaria às 4 da
tarde. Então ele resolveu tirar
uma soneca no consulado. Ah! Eu fui lá. E autorizado pelo
governador. O cônsul
ainda tentou segurar o portão. Dei-lhe um sopapo e levei o
príncipe,
explicando-lhe o mau entendido. Nos 60 anos da imigração,
assumi tudo outra
vez, 15 dias antes de recebermos o príncipe Norihito. Sucesso de
novo. Você foi um dos
fundadores de
Nippon Country Club e de mais alguns clubes. Isao: Sou fundador do
Nippon, do
Piratininga, do Arujá Golf Club e da Aliança Cultural
Brasil-Japao. Sempre fui
um homem de liderança atuante. Depois da Guerra, com aquela
rivalidade entre os
que acreditavam que o Japão tinha ganho os que sabiam a verdade,
viajei muito
para apaziguar o Interior de São Paulo. Fazíamos como
Marechal Rondon: íamos de
caravana com um especialista em cada setor. Éramos bem recebidos
pelos dois
lados. Daí surgiu a idéia de fundar o clube Piratininga,
para
animar os ânimos
e dissipar um pouco a tristeza na coletividade. Quanto ao Nippon, o
senhor
Katsuzo Yamamoto foi um grande amigo. Também era muito
contestador, por isso
tínhamos afinidades. Nota - Isao Nishi
faleceu em junho/2006. Entrevista realizada em
1998 e
publicada na Revista Nippon nº 7 - autor: Fernando Ripari Jr/NSP |
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