:: Katsuzo Yamamoto
Nascido
em 1909, no
bairro comercial da cidade de Himeji, perto de Kobe. Sua família
se dedicava ao
comércio atacadista de tecidos. Mas, em conseqüência
de especulações mal
sucedidas no mercado seu pai fechou a loja. Assim, já na idade
madura, ele foi
obrigado a trabalhar como empregado de uma empresa comercial. Por isso,
Katsuzo
fez a segunda metade do curso primário em Osaka, onde seu pai
trabalhava.
Depois, acompanhou-o, quando foi transferido para a ilha de Shikoku.
Concluiu o
curso da Escola de Comércio de Takamatsu (uma cidade de
Shikoku), em 1927,
justamente o ano em que a crise econômica atingia um ponto
perigoso. Graças ao
tio Fujimatsu Yanagida, conseguiu um emprego na famosa Casa Suzuki, da
cidade
de Kobe. “Ao
invés de fazer
um curso superior, é melhor trabalhar nesta companhia, enquanto
estou vivo. As
dívidas da empresa já chegam a 400 milhões de
ienes”. Este era, segundo seu
pai, o argumento do tio, então diretor-gerente da Casa Suzuki.
Katsuzo, que não
entendia tais questões, pensou “será que é assim
mesmo?” E se empregou na
empresa. Mas, dois meses depois, por causa da recusa do Banco de Taiwan
em
conceder mais crédito, a Casa Suzuki paralisou suas atividades
e, em seguida,
teve decretado sua falência. Foi o estopim que provocou a grande
corrida
bancária em todo o território japonês.
Começando com o Banco Jugo, em pouco
tempo, sucederam-se falências de estabelecimentos
bancários, provocando o
pânico financeiro, seguido de moratória geral. “Considerei
uma
sorte poder acompanhar tudo, do canto da sala da gerência – onde
teve início o
grande acontecimento que marcaria uma fase da história da Era
Shôwa”, relata
Yamamoto. Após
a última
reunião da diretoria da Casa Suzuki, o então
diretor-superintendente Naokichi
Kaneko, teria murmurado: “A serpente saiu do ninho e volta ao ninho”.
“Tenho
vivo, ainda hoje, na memória, o sentimento de
indignação e de admiração que
então senti pelo empresário, ao ouvir essa
história”, disse Yamamoto. Dois anos
antes
desse acontecimento, seu pai sofrera uma paralisia. Após deixar
o seu último
cargo de diretor da filial da cidade de Kanazawa (da companhia de
seguros do
grupo Suzuki), estava em tratamento de saúde, mas precisava
sustentar a
família. Abriu uma casa de comércio de arroz, em Osaka.
Estava otimista,
raciocinando que, começando do fundo do poço, só
poderia melhorar. Entretanto,
a expectativa frustrou-se. Depois do
falecimento de seu pai, pensou consigo que, do jeito que as coisas iam,
nunca
poderia melhorar de vida. Por isso, em 1932, resolve emigrar para o
Brasil,
cheio de entusiasmo e esperança. Lembra-se
que sofreu
muito, durante cerca de quatro anos, após sua chegada ao Brasil. Inicialmente
foi
para o núcleo colonial Quilombo, de Iguape, Estado de São
Paulo, graças aos
bons ofícios do Dr. Tsutomu Miura (conselheiro de sua empresa),
que havia sido
o dirigente dos imigrantes do navio Santos-Maru. “Eu semeei arroz em
terra
preparada após derrubar a mata virgem, queimada depois de seca.
Quando, dias
depois, os grãos começaram a germinar, gritei contente:
estão brotando, estão
brotando! Mas é impossível um lavrador sem nenhuma
experiência, conseguir
sucesso no cultivo de arroz. Em poucas palavras, fracassei
redondamente, como
agricultor”. Apesar do resultado, sr. Katsuzo gostava
de derrubar árvores. Por isso se entregou ao
ofício de serrador
de madeira. Também se dedicava ao trabalho de abrir estradas,
nos períodos de
folga nas atividades agrícolas. Naquela
época, os
japoneses dos núcleos coloniais da zona de Iguape (da Kaigai
Kogyo Kabishiki
Kaisha – Companhia de Fomento Industrial do Além-Mar, conhecida
pelas iniciais
K.K.K.K.) começava a se entusiasmar pela cultura do chá.
Isto porque, um
pioneiro, o sr. Torazo Okamoto, havia conseguido êxito na
industrialização de
chá preto. Por tradição, para fomentar uma
atividade econômica num núcleo
colonial, nada mais eficiente do que um exemplo de sucesso – muito mais
convincente do que qualquer propaganda ou mesmo
orientação. Ocorreu
uma mudança
radical na atitude dos lavradores, em comparação
àquela da época em que o sr.
Okamoto pregava as excelentes possibilidades oferecidas pela cultura de
chá.
Quando se propalou a notícia de que ele havia ganhado um bom
dinheiro, todos
correram a fazer o mesmo: plantar chá. A saca de semente de
chá que custava 10
mil réis subiu até 200 mil réis, em razão
da concorrência entre os próprios
lavradores. Registro, Sete Barras e Quilombo ficaram cobertos de
plantações de
chá. Como conseqüência natural, tivemos uma
superprodução, e o chá produzido
não tinha mercado. Na colônia de Quilombo também se
instalou uma fábrica de
chá, cujo diretor era Yokichi Namie. Mas, sem conseguir vender o
produto, as
150 famílias ficaram sem meios de vida. Realizaram-se
muitas
reuniões. Ficou decidido que Katsuzo Yamamoto se encarregaria de
vender o estoque
acumulado, pois, embora tivesse demonstrado ser um péssimo
lavrador, tinha tido
experiência comercial no Japão. Isso aconteceu no terceiro
ano de sua vida no
Brasil. Calçando sapatões de trabalhador, percorreu as
praças de São Paulo e do
Rio de Janeiro e, bem ou mal, conseguiu vender a produção
do ano. Pediram-lhe
então que, no ano seguinte, se transferisse para São
Paulo, a fim de se dedicar
exclusivamente à comercialização de chá. Uma vez
em São
Paulo, aplicou a técnica comercial de vencer vendendo barato,
mas vender antes
dos concorrentes. Como, porém, toda a colônia de Quilombo
se encontrava em
situação de penúria, alimentando-se de arroz
quebrado, o dinheiro da venda de
chá chegava lá como se fosse uma chuva generosa em plena
seca. Num
país onde o chá
era receitado por médicos a seus pacientes para substituir o
café, o mercado
não apresentava nenhuma perspectiva animadora. Precisava,
portanto recorrer, a
todo custo, à exportação. Enviaram amostras a
vários países, mas não obtiveram
nenhuma resposta favorável. A zona de Iguape não dispunha
de outra produção que
pudesse substituir o chá. Apesar de ficar a uma distância
relativamente curta
de São Paulo, a região não contava com adequado
meio de transporte. Todos os
moradores estavam convencidos de que não havia outra cultura
melhor, porque o
chá preto era um produto beneficiado, de peso leve e de
preço unitário
relativamente elevado. Por isso, não havia nenhuma possibilidade
de acordo, por
exemplo, para reduzir a produção. Nessa
altura dos
acontecimentos, por iniciativa da colônia de Registro, uma
coletividade maior e
mais antiga, foi organizada a Cooperativa de Produtores de Chá
do Sul de São
Paulo, tendo como seu núcleo principal a Cooperativa de
Registro, que tinha
como diretor-gerente Shinkichi Suginoshita. A fábrica de
chá de Quilombo,
convidada, participou também. Katsuzo Yamamoto foi nomeado
representante geral
da nova cooperativa, cuja produção representava cerca de
60% da produção
brasileira, não tinha ainda muita confiança em si, mas
não tinha outra
alternativa. Julgou que se conseguisse exportar, poderia escoar toda a
mercadoria. Entretanto, ficou decepcionado quando, em resposta a uma
amostra
enviada anteriormente à Holanda, recebeu a
observação de que aquilo não era chá
preto, e sim folha de mato apodrecida. A
Cooperativa tinha
como um de seus objetivos, desde sua fundação, trazer do
Japão, um orientador
técnico de industrialização de chá.
Conseguiram a vinda, com bom timing,
do engenheiro Izumiji. Através dele aprenderam que o chá
se faz amassando-se as
folhas e fermentando-as, interrompendo o processo em tempo certo, por
meio de
ar quente. Ultrapassando esse grau, as folhas apodrecem, como de fato
estava
ocorrendo. Graças
ao trabalho
do técnico, a qualidade do chá melhorou e iniciou-se a
venda do produto para
Argentina, Chile, Holanda, Alemanha e Estados Unidos. A industria de
chá pôde
respirar aliviada. E a guerra que estourou, em 1939, na Europa,
estimulou a
exportação. Todavia,
com a
entrada do Japão no conflito, este se transformou numa
conflagração mundial. E
a Cooperativa de Produtores de Chá do Sul de São Paulo
foi compulsoriamente
liquidada, quando o Brasil entrou na guerra, assim como o cargo de
Katsuzo
Yamamoto. A fábrica (com a marca de Chá Tupi) continuou a
existir, e, anos
depois, foi absorvida pela Cooperativa Agrícola de Cotia. Ainda
hoje,
prossegue. Desde o
momento da
liquidação de seu negócio, precisava descobrir um
novo meio de vida.
Felizmente, por gentileza e colaboração de Masaki
Kitagawa, de São Roque,
começou a venda de cebolas por comissão; e com apoio e
orientação de Katsuki
Nishimura, então diretor do Departamento de Vendas da
Cooperativa Agrícola de
Cotia, lançou-se no negócio de compra de
batatas-sementes. E por causa dessas
circunstâncias, acabou se transformando em atacadista de batata,
atividade de
que, afinal, iria viver durante mais de dez anos. Este comércio
lhe pareceu o
ganha-pão mais indicado para um moço – com pouco capital.
Nesse negócio
decide-se a sorte mediante a venda imediata das batatas ou então
deixa-las
apodrecer. Como a cotação varia muito rapidamente e a
transação exige giro
veloz de capital, há muitas possibilidades de lucro e
também grandes riscos de
perda. Por sorte, contava com bons clientes na zona produtora, assim
como
jovens e excelentes colaboradores. Por isso conseguiu o capital
necessário para
começar uma nova atividade: importação de artigos
japoneses. Posteriormente ,
transferiu o negócio atacadista de produtos agrícolas a
seus colaboradores e
começou uma indústria de lâmpadas especiais. Foi no
ano de 1955, quando o
Brasil iniciava sua política de substituição de
importações. Com a finalidade
de nacionalizar a produção de lâmpadas de Natal e
de decoração, até então
importadas, inaugurou, em 1958, a Indústria de Lâmpadas
Sadokin S.A., mediante joint-venture,
com a sua cliente Sociedade Anônima Sadoshima Kinzoku, do
Japão. Em 1964,
a conselho
do então embaixador sr. Keiichi Tatsuke viajou pelo Nordeste do
Brasil, na
qualidade de subchefe da caravana organizada por vinte e uma
empresas-membros da
Câmara de Comércio e Indústria Japonesa do Brasil.
Foi atraído pela política de
desenvolvimento do Nordeste. E contando com a colaboração
do sr. Shigeaki Ueki
(diretor da Petrobrás, na época), que então servia
em sua empresa, elaboraram
um prjeto que, em 1968, obteve a aprovação da Sudene. No
ano seguinte iniciaram
a produção de lâmpadas domésticas, na cidade
do Recife, com a participação da
Hitachi e da Sumitomo Shoji. Katsuzo
é grato às
duras experiências que teve em Osaka, as quais serviram de
lição das mais
proveitosas. Não declarou antes, mas, desde a época em
que vendia chá preto,
mantinha, com a ajuda de sua esposa, um armazém de secos e
molhados. Essa
atividade comercial que começara como uma quitanda, durou pouco
mais de dez
anos. Cada vez
que mudava
de área de atuação, defrontava-se com novas
dificuldades. Julga realmente que
deve à “escola de Osaka”, o seu método de começar
novas atividades, abandonando
outras que acabavam de entrar nos eixos. Outrossim, acredita ter
recebido uma
boa lição de vida de seu pai, que passou metade de sua
existência como simples
assalariado. Tanto isso é verdade que, desde quando ele tinha um
negocio
bastante modesto, dividia os lucros ou distribuía quotas entre
seus
funcionários, para assegurar o seu bom desempenho. Sempre adotou
o sistema de
distribuição de lucros, para que seus funcionários
não ficassem na condição de
simples assalariados. Durante
certo
período inicial de sua vida no Brasil, os imigrantes
nipônicos se juntavam como
folhas caídas pelo sopro do vento, e uniam-se uns aos outros,
estabelecendo uma
íntima cooperação mútua. Tem se aí
os primeiros fundamentos da vida dos
japoneses do Brasil, donde nasceu o entendimento entre eles, gerando um
relacionamento mais humano de amizade e ajuda recíproca – que
produziu a
chamada colônia nipônica. Esta é a
noção aceita por toda a Colônia. Anos
depois, Soichi Oya (escritor japonês) disse que, se alguém
quisesse conhecer
japoneses das eras Meiji e Taisho, deveriam ir ao Brasil. Não se
sabe se Oya
percebeu intuitivamente, ou se chegou a conhecer por
observação pessoal, o
ambiente de folhas reunidas pelo vento. O certo é que, na
Colônia, se mantém o
costume generalizado de cuidar bem das relações humanas.
E Katsuzo Yamamoto
acredita que esse relacionamento constitui o fulcro dos empreendimentos
empresariais, os mais diversos existentes em toda parte. Em seus
pequenos
negócios, igualmente, amigos e seus filhos, dos tempos do
núcleo colonial de
Quilombo, clientes da época em que ele negociava com produtos
agrícolas, formam
o centro de sua organização empresarial ou são
até mesmo seus sócios. Era uma
característica fundamental de sua empresa, jamais esquecer quem
quer que seja,
uma vez estabelecido um relacionamento comercial. Com a
empresa
Sadoshima Kinzoku (sociedade anônima) mantinha
relações desde o início de suas
transações com o Japão, para mais tarde passar a
ser sócia das Lâmpadas
Sadokin. Por causa de seu relacionamento com Hisashi Tsuda
(então diretor da
filial de Nova York e presidente da Sumitomo Shoji), por cujo
intermédio se
tornou representante da empresa – embora apenas por dois anos – tinha
colaboração de seu capital na fábrica de Recife. Como,
durante a
guerra, não era permitido embarcar mercadorias em nome de
japoneses, conseguiu
prosseguir nas transações internacionais, em nome de um
membro da família,
Feliciano Fernandes, de origem portuguesa, que foi seu padrinho e de
sua
senhora, mantendo relações fraternais com sua
família. O amigo, Kazuo Ido (seu
sócio), cria da casa, casou-se com uma jovem da família
Fernandes. Junto com
sua esposa, foi padrinho da filha de Ido. “Temos
inúmeros
casos – impossível enumerar todos – de relacionamento humano
amistoso, que
considero muito gratificante e desejo mantê-los com carinho...
Creio que sou o
que sou, graças à somatória desses relacionamentos
humanos”. |
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