:: SURGE O XOGUN Sob um
regime
espartano, o Japão conhece a paz e a guerra e consolida uma
classe atípica: a
dos samurais. Onde
está o segredo
do milagre japonês? De que forma o Japão conseguiu se
tornar a segunda potência
econômica do mundo? Perguntas como estas saltam das bocas de
nós, ocidentais,
com freqüência. Para respondê-las, no entanto,
não é fácil se não retornarmos à
sua formação histórica. Até a segunda
metade do século XIX, o Japão mergulhou
num longo período, que ficou marcado pelo domínio dos
samurais, com o xogun à
frente do governo. Principalmente
nos
265 anos do xogunato Tokugawa, período em que floresceu uma
cultura tipicamente
nacional, o país se isolou completamente do mundo. O
caráter do japonês é uma
das remanescências dessa época. Quem sabe, essas
influências talvez tenham
pesado no seu sucesso? Quem era
o xogun
Antes de
entrar na
era moderna, que só aconteceu com a Reforma de Meiji em 1868, o
Japão
mergulhara cerca de 700 anos num período em que a casta que
determinava os
destinos da nação era formada por uma soldadesca
corporativa denominada
samurai. Os samurais, rudes e disciplinados oriundos do campo, surgiram
justamente para defender a posse da terra o que acabaria provocando,
mais
tarde, o feudalismo japonês. A agricultura era, então, a
principal riqueza e as
sacas de arroz, a moeda de maior valor. A
nação nipônica
sempre foi unificada através do Imperador. No entanto, com o
apogeu dos
samurais, o Imperador perdeu o poder junto com a aristocracia urbana e
decadente. Passou então a ficar isolado no castelo em Kyoto,
enquanto que o
primeiro xogun, Yorimoto Minamoto, (generalíssimo que passou a
administrar o
Japão) mudou-se habilmente para Kumamoto. As outras
famílias samurais que
ganharam a estima da casa Imperial (Fujiwara e Taira), por outro lado,
em vez
de se fortalecerem, acabaram se deteriorando junto com a luxuosidade e
conforto
em que viviam os aristocratas. Davas
início,
assim, ao controle do país pelos xoguns, samurais que, pela
linhagem, tinham
algum parentesco com a família Imperial. Os xoguns governavam em
nome do
Imperador e como unificador da nação e, para se conseguir
essa unificação
formava alianças com outros chefes samurais, eliminavam
sumariamente os
inimigos e as resistências através da força
militar. Nesse tempo, o Japão era
uma nação armada. Vale lembrar que, para os Minamoto
derrotarem os seus
arquiinimigos – Atira – chegarem ao poder, muito sangue foi derramado. No
último ano de
Minamoto (1192-1333), houve uma tentativa de volta ao regime Ritsuryo
(Imperador com poder), fato que ficou conhecido na história como
Restauração
Kemmu. Sem sucesso, porém, logo um outro xogunato foi
implantado, a família
Ashikaga (1338-1573). A restauração Kemmu durou apenas
três anos. Com
Ashikaga, Kyoto
retornou a capital, tendo o governo centralizado no Palácio das
Flores. Durante
esse governo, rebeliões nas aldeias por posse de terra,
conhecidas por “Onin no
Ran”, abalaram o sistema. Mas o país conheceu também as
belezas das artes
plásticas e intelectuais, com a construção do
Pavilhão de Ouro (Kinkakuji) e o
Pavilhão de Prata (Guinkakuji), além de testemunhar o
surgimento do teatro Nô.
No final de xogunato Ashikaga, no entanto, iniciou-se o Período
“Sengoku
Judai”, guerras civis que se alastraram entre os feudos e que
culminaram com o desmantelamento
do país. Foi nessa
época que
o primeiro ministro ocidental chegou ao Japão. O mercador
português, Fernão
Mendes Pinto, em 1542, encalha nas praias de Kagoshima (antiga Satsuma)
impelido por um temporal. Aportam
os Estrangeiros
A partir
de Mendes
Pinto, a rota para o Japão ficou reservada aos interesses da
coroa portuguesa.
De um lado, encontravam-se os jesuítas, de outro, os
comerciantes. Tudo isso
fez com que a configuração da história japonesa
mudasse de rumo: a arma de fogo
foi introduzida ao lado da fé cristã. As
guerras internas
continuaram e enfraqueceram o xogunato Ashikaga, enquanto que nos
campos de
batalha surgiam líderes sequiosos pelo poder. O primeiro deles
foi Nobunaga Oda
que, após muitas vitórias, acaba por ser traído e
assassinado; vingado, porém
pelo seu protegido Hideyoshi Toyotomi, que se torna seu sucessor. A
unificação
do país é conseguida através de guerras sucessivas
entre as forças
governamentais e os feudos rebeldes. O livro Xogun
mostra a chegada de um piloto inglês no comando de uma galera de
bandeira
holandesa bem no período que antecedia a derradeira batalha de
Sekigawa em
1600. O piloto, ao qual se refere o livro Xogun é na
verdade, Willian
Adams, que se tornou conselheiro predileto de Ieyasu, o primeiro xogun
da dinastia Tokugawa. Adams acaba os seus dias morrendo no Japão
por ser
impedido de retornar à sua terra, como mostra o romance. No
governo nas mãos
dos Tokugawa (1603-1868), com capital transferida para Edo, uma nova
política
foi adotada: a do isolamento do país a qualquer
interferência externa. O
comércio foi abolido, os estrangeiros expulsos e a
religião cristã proscrita.
Com isso, o xogun pretendeu defender os interesses nacionais,
provocando
a auto suficiência e a paz. Para manter a tranqüilidade
almejada, Ieyasu
utilizou-se de alianças e manteve em seu castelo a
família dos chefes militares
das províncias. No
período Tokugawa,
de quase dois séculos e meio, formou-se a verdadeira face para
se chegar ao
japonês atual. Sem se preocupar com improváveis guerras, a
vida urbana ganhou
impulso, enquanto se consolidava o impulso japonês. Nem mesmo a
Reforma Meiji
veio modificar totalmente as regras que regulavam o espírito dos
samurais.
Tanto isso é verdade que usa-se o termo “samurai moderno” para
os empresários
japoneses. Tudo que acontece hoje em dia volta-se um pouco para os 700
anos de
domínio samurai, em particular ao que a era Tokugawa transmitiu. Matéria publicada
em 5/86, no Jornal Portal. Autor: Francisco Handa. AO USAR
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