jul 192021
 

Em dezembro de 2014 a revista especializada “Zexy”, líder do segmento moda noiva e organização de eventos matrimoniais no Japão, publicou uma edição especial disputadíssima, que meio que “oficializou” um casamento, que nunca ocorreu: a união de Oscar de Jarjayes e André Grandier, protagonistas do mangá “A Rosa de Versalhes” da desenhista Riyoko Ikeda. O que chama a atenção neste caso é que ao invés de apresentar matérias com fotos de modelos reais a caráter em igrejas e salões decorados para a ocasião, os modelos dessa edição são personagens fictícios: desenhos de quadrinhos!

Nas últimas décadas fãs passaram a produzir ilustrações e histórias procurando realizar o sonho que Oscar e André não puderam realizar em “A Rosa de Versalhes”: se casar.

Após dezenas de anos de pedidos de fãs, a autora Riyoko Ikeda finalmente cedeu e criou as ilustrações publicadas na “Zexy”, revelando certo desconforto ao fazer esse trabalho numa entrevista: “Gastei toda minha energia para desenhar essas páginas, mas me senti tão envergonhada que não pude sequer ficar lá”. É difícil entender sentimentos contraditórios em relação a ilustrações, que embora tenham alegrado as fãs, causaram constrangimento à autora.

Capa da revista Spur de Outubro de 2014

Teorias sobre o luto falam das etapas de negação, raiva, negociação, depressão e aceitação, e o fato é que fãs de “A Rosa de Versalhes” parecem estar longe da aceitação mantendo Oscar e André vivos na lembrança e produzindo desenhos onde ambos se casam, têm filhos e uma vida normal. Pode ser que desejar que esses personagens tivessem tido um final feliz seja uma bela negação e de que ilustrações do casamento que nunca ocorreu na história original seja a manifestação definitiva do mais longo luto da história do mangá, que completa 50 anos em 2022. Mas já que o amor tudo conquista, e tendo se tornado parte da cultura popular contemporânea, o romance de Oscar e André pode literalmente alcançar a imortalidade repetindo o fenômeno previsto por Shakespeare ao final de sua peça mais famosa, pois “há de viver de todos na memória de Romeu e Julieta a triste história”.

Texto: Cristiane A. Sato, autora de JAPOP – O Poder da Cultura Pop Japonesa, NSP Editora.

Saiba mais sobre “A Rosa de Versalhes”, conhecida também como “Berubara” entre os fãs 

Para entender mais sobre esse tema:

“O Culto ao Barroco Romântico no Japão”. Dia 11 de setembro de 2021, on-line, às 9 horas. Palestra com a profa. Cristiane A. Sato. Promoção da Abrademi e da Associação Cultural Mie Kenjin do Brasil. Evento gratuito.

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jul 162021
 

Publicado pela primeira vez em capítulos semanais na revista “Margaret” de abril de 1972 a dezembro de 1973, o mangá “A Rosa de Versalhes” se tornou um imediato sucesso ao contar a história trágica da Rainha da França, Maria Antonieta, e da Revolução Francesa. O próprio mangá se tornou um marco ao revolucionar o chamado mangá feminino, antes visto com desdém pelo mercado editorial uma vez que até então os quadrinhos para meninas de 8 a 15 anos não passavam de melodramas superficiais e altamente fantasiosos.

Apesar de romancear a história com referências ao glamoroso Palácio de Versalhes e à vida de luxo da corte, o mangá também mostrou temas que hoje seriam muito politicamente incorretos para crianças, como a vida de crimes, pobreza e revolta nas favelas de Paris e a prática de corrupção, pedofilia e vícios diversos de membros da aristocracia e da igreja. Maria Antonieta é mostrada como a primeira grande vítima de fake news da história, humanizada por sua ingenuidade e redimida por seu amor incondicional aos filhos. Axel von Fersen, aristocrata sueco que foi amante da Rainha, é mostrado como a personificação da devoção e do cavalheirismo.

Os fatos históricos que culminaram na Revolução Francesa são contados no mangá sob a ótica de Oscar, filha caçula de uma tradicional família de militares criada pelo pai como homem para poder herdar os privilégios da família e de André, seu criado e amigo mais terno e leal. Ao longo da série o relacionamento entre Oscar e André evolui da amizade fraternal na infância ao amor adulto proibido pela diferença de classes sociais. Às vésperas da Revolução o ato supremo de rebeldia de Oscar e André foi assumir o amor que tiveram por toda a vida e lutar pelos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade. Por serem Maria Antonieta e Fersen personagens históricos todos já sabiam qual era o final deles, mas sendo Oscar e André personagens fictícios o destino deles era uma incógnita e o desenrolar dessa história prendia os fãs. Assim, foi um grande choque coletivo quando Oscar morreu lutando por seus ideais comandando a Queda da Bastilha e André morreu heroicamente tentando salvá-la, o que desencadeou uma crise real quando milhares de fãs manifestaram surtos de choro e sintomas de luto sincero – tudo causado por um mangá!   

Desde então “A Rosa de Versalhes” virou um cult. A história ganhou versões em teatro, TV, cinema, se espalhou pelo mundo e popularizou o estilo rococó e o setecentismo como o auge das artes do Ocidente no Japão, Taiwan e Coréia do Sul. Na Europa a série em animê foi um grande sucesso, especialmente na Itália onde gerações de senhoras ainda se lembram do impacto de “Lady Oscar”: apesar de ser um desenho animado, muitas mães assistiram a série com os filhos pois a história também cativou um público adulto. Assim como no Japão, na Itália a comoção geral e as lágrimas se repetiram: em tempos sem Internet a TV reinava absoluta e todos viam os mesmos programas ao mesmo tempo.

Para entender mais sobre o tema:

“O Culto ao Barroco Romântico no Japão”. Palestra on-line ministrada e gravada no dia 11 de setembro de 2021, às 9 horas. Palestra com a profa. Cristiane A. Sato. Promoção da Abrademi e da Associação Cultural Mie Kenjin do Brasil. Assista a gravação no Youtube (acima).

Caso queira, há a versão falada em inglês da mesma palestra: English Version “Japan’s Romantic Baroque Culture”

 

jun 172021
 

No dia 20 de Junho, um bate-papo on-line reunirá dois destacados nipo-brasileiros.

Oscar Satio Oiwa, é artista plástico, nascido em São Paulo, que mora em Nova Iorque. Ele, enquanto estudante de arquitetura da USP, foi bolsista da Associação de Intercâmbio Infanto-Juvenil Brasil-Japão, e depois, em 1991, se mudou para o Japão onde permaneceu por 11 anos, e desde 2002 mora nos Estados Unidos. É um artista contemporâneo e, além de pintar quadros, produz grandes instalações, como a obra com navios de imigrantes montada no Museu de Imigração da JICA de Yokohama este ano.

A conversa será conduzida pelo professor Ângelo Ishii, formado em jornalismo pela USP, com pós-graduação na Universidade de Tóquio e na Universidade de Niigata, e foi redator-chefe de um jornal para brasileiros publicado no Japão. É especialista em sociologia internacional e imigração, e leciona na Universidade Musashi desde 2004. É diretor administrativo da Associação Kaigai Nikkeijin Kyokai.

Data: 20/06/2021 (domingo) 2:00 ~ 3:15 (Horário de Brasília)

O link é do YouTube. Após esse horário, o vídeo estará à disposição permanente.

海外日系人協会Youtubeチャンネル(https://www.youtube.com/user/wwtjadesas)

Dia Internacional Nikkei

O dia 18 de junho, que é a data da chegada do navio Kasato Maru ao porto de Santos, é o Dia da Imigração Japonesa. O Dia Internacional Nikkei é o dia 20 de junho, que marca a chegada dos primeiros imigrantes japoneses no Havaí, em 1886. 

Veja texto relacionado: http://www.culturajaponesa.com.br/index.php/veja-como-foi-60a-convencao-dos-nikkeis-e-japoneses-do-exterior/

fev 272021
 

Jiro Kawarazaki foi a estrela do filme “Gaijin – Caminhos da Liberdade”, da estreante diretora Tizuka Yamasaki, de 1980. O filme conta a história da imigração japonesa à partir da chegada de uma família numa fazenda de café no interior de São Paulo. Jiro e Kyoko Tsukamoto representam Yamada e Titoe, que formam o casal principal do enredo.

Jiro faleceu em julho de 2020, vítima de uma parada cardíaca. Tinha 79 anos de idade. A família não divulgou o fato, e a mídia só tomou conhecimento um mês depois, mas deu poucas linhas à respeito desse ator.

No currículo de Jiro constam 19 filmes longa-metragens feitos no Japão, entre 1961 e 1992. Num filme de 1974, “Wagamichi”, de Kaneto Shindo, Jiro tem um papel secundário, mas é um filme interessante porque trata de problemas das famílias de decasséguis da região do Tohoku, sobre uma história real de 1966. Jiro teve uma carreira mais longa e respeitável na TV, atuando em vários episódios da série de samurai “Mitokoumon” da TBS e em muitos outros, de vários estilos. Jiro também atuou nos palcos onde trabalhou em várias peças. O pai de Jiro era um famoso ator de Kabuki em Tóquio, já na quarta geração de atores dessa modalidade, e seus dois irmãos, duas irmãs e uma prima também seguiram a carreira de artística.

Comentário pessoal:

Lembro do Jiro Kawarazaki quando tinha acabado de chegar do Japão e estava num hotel de Atibaia, cidade onde seriam realizadas as primeiras tomadas com os atores japoneses. Jiro, Kyoko e Yuriko Oguri foram contratados pela Tizuka, e dentre eles, Jiro era o mais famoso naquela época. Mas era bastante humilde.

Na época, eu trabalhava e estudava à noite, e não tinha tempo, mas queria praticar o idioma japonês. Daí eu me oferecia ao Sanenari Oshiro, que era redator do jornal São Paulo Shimbun, para ir entrevistar artistas japoneses nos finais de semana. Nem sempre os artistas eram profissionais. Na maioria das vezes eram grupos de estudantes que vinham por intercâmbio e traziam alguma coisa para apresentar. Claro, o trabalho era voluntário e mesmo as despesas de transporte não eram reembolsadas. Não havia nenhuma espécie de apoio. Eu recebia um número de telefone e um nome, e depois eu ia atrás. Nesse caso, eu procurei o contato da Tizuka, a diretora do filme, liguei, marquei e fui no escritório dela. Os atores ainda não tinham chegado, mas fiquei sabendo que chegariam e fariam a primeira tomada naquele final de semana. Peguei o ônibus e fui para Atibaia. No hotel, a Tizuka disse que o intérprete não estava, e que iria chamar os japoneses.

Assim fiquei conhecendo o trio de atores, todos muito simpáticos, apesar de cansados da viagem. Naquele dia, como não ia ter filmagem, eu os levei até a praça de Atibaia onde estava tendo uma feira de artesanato. E lá comprei um pacotinho de coquinho doce. O Jiro gostou tanto daquilo, que voltou sozinho e comprou um monte deles.

Voltei a Atibaia novamente, num outro final de semana. Os atores já tinham feito várias cenas e estavam todos bastante integrados com o ambiente. Antonio Fagundes, Gianfrancesco Guarnieri, Ken Kaneko e José Dumont faziam parte do elenco e, por sorte, todos estavam lá. Conversei bastante com o José Dumont e com o Jiro Kawarazaki. Foi a última vez que o vi.

“Gaijin” foi o melhor filme do Festival de Cinema de Gramado de 1980. José Dumont recebeu o prêmio de melhor ator coadjuvante. Quem não assistiu deveria assistir.

Francisco Noriyuki Sato

dez 292020
 

Hyakunin Isshu é uma antologia de poemas curtos “waka”, reunidos pelo poeta Fujiwara no Sadaie (ou Teika), que viveu de 1162 a 1241, e também é o nome de um jogo de baralho “Karuta”, muito popular no Japão. Trata-se de um jogo aparentemente intelectual, onde os participantes procuram entre as cartas o poema que está sendo lido. Atualmente, após o sucesso do mangá “Chihayafuru” de Yuki Suetsugu, depois transformado em animê e mais tarde em filmes para cinema (foto), são os jovens que mais praticam essa modalidade no Japão e no mundo. O jogo de Hyakunin Isshu exige muita velocidade e, por isso mesmo, um bom preparo físico dos participantes.

No Brasil também existem muitos praticantes, e o grupo Meguriai Karuta Kai, de São Paulo, resolveu fazer a cobertura da primeira partida ao vivo, com comentários em português. O evento é presencial e reúne os melhores do mundo e estará acontecendo no Templo Omi Jingu, na província de Shiga, que homenageia o Imperador Tenji (626 a 672). O Imperador Tenji é o autor do primeiro dos 100 poemas que compõem o jogo de Hyakunin Ishuu, e por isso, o Omi Jingu é considerado o santuário de Karuta. O local ficou famoso depois que foi cenário do filme “Chihayafuru”, mas o local sedia há muito mais tempo os tradicionais campeonatos de Karuta.

No dia 8 de janeiro de 2021 (sexta-feira), serão transmitidas pelo Youtube as partidas que decidem os melhores jogadores de karuta do mundo, em que os vencedores recebem o título de Queen e Meijin. As partidas acontecem no formato melhor de cinco (ganha quem vence três). Os membros do Meguriai realizarão a cobertura ao vivo da primeira partida, com chamada no Google Meets por volta das 21h30 (horário a confirmar) para explicar as regras do jogo e esclarecer dúvidas dos participantes. O evento tem previsão de terminar por volta das 23h30, será gratuito e aberto a todos.

A inscrição será realizada mediante preenchimento do formulário: https://forms.gle/HbCRdWxdoYTEwYRK8

Para quem quer entender um pouco mais sobre o jogo antes da transmissão, veja aqui os comentários escritos pelo grupo Meguriai sobre as partidas que definiram os competidores do Campeonato de Queen e Meijin. https://meguriaikai.wordpress.com/2020/11/16/a-partida-do-desafiante-2020-impressoes/