Arte do Butsudan, o altar budista
Embora o budismo esteja presente em Kanazawa há muito tempo, pois o monge Keizan Zenji (1227 ~ 1325) levantou ali perto o templo Sojiji, que iria ser a base da escola Soto Zen, foi a difusão do budismo Jodo Shinshu que propagou a utilização do Butsudan (altar budista) nas casas das pessoas comuns. Jodo Shinshu chegou na região por volta do século 17, e coincidiu que havia em Kanazawa muitos artesãos disponíveis, uma vez que o chefe do clã Kaga, Toshitsune Maeda, havia investido no ensino dessas técnicas, trazendo mestres de Kyoto e Osaka. Posteriormente, seus descendentes difundiram a ideia de que todas as famílias deveriam ter seu próprio Butsudan em casa.
Assim, Kanazawa passou a ser o maior produtor de Butsudan do Japão. No meio do Período Edo, com a proibição de transferência de artesãos entre os feudos, fortaleceu-se um estilo próprio da região, diferente dos estilos praticados nos altares de outras regiões.
Primeiro, a madeira, geralmente das árvores Ginkgo e Hiba Arborvitae, são trabalhadas, fazendo-se encaixes precisos e detalhes, sempre levando em conta a espessura que terá o acabamento laqueado. Separadamente são feitos os enfeites do altar, com entalhes minuciosos e muitas pequenas peças são feitas e encaixadas.
Entalhes – É utilizado o pinho vermelho para as peças externas a serem entalhadas. As peças são laqueadas manualmente ou recebem as finas folhas de ouro.
Na decoração interna são utlizados os “maki-e” decorados em papel japonês “washi” que são adornados com pó de ouro ou prata.
Todas as peças, exceto os papéis, são polidos, recebendo camadas de verniz transparente e uma pasta oleosa, os quais irão corrigir quaisquer imperfeições na superfície. Cada uma das fases é executada por um especialista, portanto, são vários artesãos trabalhando para um Butsudan. Depois, chega a fase da montagem, e aqui aparece um profissional que produz na mão as peças metálicas, como dobradiças, testeiras e travas de fechamento. Essas peças, feitas em finas chapas de liga de cobre (latão, bronze) também são trabalhadas, entalhadas e obedecem a estética geral do altar construído.
O latão ganha forma e desenho, e muda de espessura na mão do artesão
Takayuki Sugibayashi é um hábil artesão, com experiência de 50 anos na arte de esculpir chapas de latão. Das mãos dele saem as dobradiças e outras peças metálicas, cuidadosamente adornadas com o uso de ferramentas simples feitas por ele mesmo. Esses artesãos estão desaparecendo no Japão. Kanazawa, que é o maior centro produtor, só tem dois profissionais (incluindo ele). Primeiro, a chegada do Butsudan feito na China, mais barato, diminuiu o mercado de trabalho. O mestre Sugibayashi conta que o seu filho aprendeu a técnica e estava trabalhando, mas como tinha poucos pedidos, ele desistiu e foi trabalhar numa outra área. Depois, quase todas as famílias já possuem Butsudan em casa e há casos daquelas que não as querem mais e acabam levando para depositar nos templos. Muitas famílias moram em pequenos apartamentos, onde qualquer espaço faz diferença. O que há hoje são reparos dos altares antigos em uso. “Os Butsudans de boa qualidade duram 200 anos, mas é preciso fazer manutenção a cada 50 anos”, explica o mestre. É quando a tinta começa a perder o brilho e alguns Butsudans mais antigos, onde foram utilizadas as dobradiças de cobre, que é mais mole, precisam da substituição de peças. Ele faz questão de confeccionar a peça exatamente como era o original da época.
O mestre Sugibayashi conta que iniciou na profissão por acaso. Ele havia terminado o colegial e não havia conseguido um emprego que almejava. Ele participava de um grupo que fazia teatro amador de marionete, e um dos colegas tinha um pai que trabalhava no setor. Certo dia, ele disse que o pai estava precisando de ajuda para fazer alguns trabalhos. E assim, ele foi aprendendo e acabou se dedicando a vida inteira àquele ofício.
Há um esforço do governo de Ishikawa e também dos artesãos para dar continuidade à tradição. O governo instalou o Museu de Artes e de Manufaturas Tradicionais, onde faz exposições e os visitantes podem participar de oficinas e conversar com os próprios mestres sobre as várias modalidades artísticas da arte de Kaga (nome antigo da região de Ishikawa).
O Museu fica no meio da cidade de Kanazawa, no maior parque da cidade, o Kenrokuen. http://ishikawa-densankan.jp/
O site está em japonês, e tem a descrição de todos 36 tipos e estilos artísticos praticados tradicionalmente na região, além do mapa de localização.
Para saber mais sobre Kanazawa, em português: http://kanazawa.net.br/